Nessa semana cerca de 25 mil pastores reunidos em Brasilia escolheram em votação o Pastor José Wellington Bezerra da Costa como Presidente da Convenção Geral das Assembléias de Deus. Abaixo Entrevista com o Pastor José Wellington:
Folha: O que o conjunto de valores dos evangélicos pode trazer para a discussão
dos direitos humanos?
Pastor José Wellington : Em primeiro lugar, eu parto da premissa da própria vida na nossa
Constituição. Que todos nós somos iguais perante a lei. Alguém disse que somos
quase iguais, mas a letra disse que somos iguais. Acho que todo brasileiro deve
ter sua liberdade de culto, de voto, do ir, do vir, os princípios de direitos
humanos que a Constituição predispõem, acredito que ali está muito correto para
todos nós. E também, em relação ao Estado ser laico, eu entendo perfeitamente o
texto da lei. O Estado é laico, mas o povo é cristão, o povo tem religião. De
maneira que essa interpretação. Entendo é que na vida administrativa deve ser
separado um do outro, são dois ramos equidistantes, porém quando se trata da
vida religiosa, todo povo tem a sua religião. E eu respeito perfeitamente. Eu
tenho amizade por todos eles [líderes de outras religiões].
Qual deve ser o papel de qualquer igreja num Estado?
Em primeiro lugar, nós trabalhamos para paz social, na recuperação da
criatura humana. Eu entendo que o homem, em si, tem condição de se recuperar em
qualquer circunstância da vida. O lado social, o benefício à criatura humana em
todas as áreas da vida, desde a educacional, da alimentação, da parte familiar,
da parte social, de se integrar à sociedade, procurar ajudá-lo para que ele
consiga emprego, trabalho, afim de que essa pessoa, que era uma pária para a
nação, passe a ser um cidadão de bem, operando, contribuindo para a nação.
Na parte religiosa, nós temos muito o que ensinar da palavra de Deus, nada
do José Wellington, eu prego Jesus Cristo, nosso salvador. Quando nós pregamos
a bíblia, ela em si tem um poder transformador, não há necessidade de qualquer
adendo, qualquer filosofia para misturar com a bíblia, ela em si já é a
autoridade divina. O meu caso: aceitei Jesus com 8 anos de idade. Não fumei,
não bebi, não me prostituí. Eu tenho quase 79 anos e tenho uma saúde perfeita.
O assédio dos políticos a vocês é muito grande?
É sim, somos bastante assediados. Só que a minha orientação como presidente
foi sempre procurar ajudar os de casa. Por que, se eu elejo uma pessoa do nosso
convívio eclesiástico, [é] alguém que eu tenho uma certa ascendência [sobre],
que ele possa ser um legítimo representante da igreja. Temos que trabalhar os
de casa. Eles merecem a atenção, a ajuda e a confiança.
Como vocês escolhem as pessoas que apoiam?
Chegou a ser de senador para cima, que precisa de mais votos, aí nós
procuramos alguém que seja, no mínimo, amigo da igreja.
O que é ser amigo da igreja?
Normalmente, o senador da República já foi prefeito, já tem uma história na
vida política. E nós então vamos buscar. Nós tivemos algumas dificuldades com o
PT em São Paulo. Hoje não temos mais, graças à Deus por isso. Hoje tenho boa
amizade com o prefeito de São Paulo [Haddad], sempre tive muita amizade com o
Kassab, que saiu, tenho muito respeito e muita amizade também pelo governador,
agora, eu não posso fazer divergência de partidos, eu trabalho com o povo. Na
Igreja eu tenho PT, eu tenho PR, tenho PSDB, cada um acha que sua filiação está
correta, Deus te abençoe. No contexto geral, somos crentes.
Qual a sua opinião sobre a Dilma?
Eu vejo com muito bons olhos. Confesso a você que não votei na Dilma. Eu
tinha certos resquícios do PT lá em São Paulo. Mas esta senhora tem superado
[as expectativas]. Ela pegou uma caixa de marimbondo na mão, mas tem sido muito
honesta com seu governo e com o povo. Hoje, na minha concepção, a candidatura
dela é uma nomeação, não precisa nem ir para a eleição, ela é eleita
tranquilamente.
Vocês apoiam ela em 2014?
Eu até teria muito motivo para dizer não, mas esqueço tudo isso aí a bem do
povo, ela tem sido muito correta na administração do nosso país.
Com "PT de São Paulo" o senhor quer dizer Marta Suplicy?
[Risos] Deixa isso pra lá. O meu concorrente [na eleição desta semana],
pelas informações que eu tenho ele recebeu todo o beneplácito do Planalto. Eu
não recebi, e não recebi porque também não pedi. Na nossa igreja em São Paulo
nunca entrou um centavo nem da prefeitura, nem do Estado nem da nação. Nunca
pedi, de maneira nenhuma. A presidenta, num ano desses, eu estava
aniversariando e ela foi lá me ver, me dar os parabéns. Foi lá com quatro
ministros, o Padilha e outros mais. Recebi com muito carinho, muito amor,
perfeitamente. Mas não peço. Agora, entendo que, se algum dia precisar pedir,
sou um brasileiro que paga imposto, tenho tanto direito quanto os demais.
E o senhor tem um poder muito forte.
Vou dizer uma coisa para você. Eu não sou político, sou de uma família de
políticos. Meu irmão foi deputado estadual durante três legislaturas. Minha
filha é vereadora em São Paulo, a Marta, foi reeleita agora pela terceira vez.
O Paulo foi eleito deputado com 162 mil votos, uma votação relativamente boa
para São Paulo. E acredito que, pelo trabalho que ele está fazendo, talvez
supere os 200 mil votos agora [em 2014]. Na eleição passada, ainda o [Orestes]
Quércia [ex-governador de São Paulo, morto em 2010] era vivo, ele foi lá na
nossa Igreja, ele, [o ex-prefeito Gilberto] Kassab e o [ex-governador José]
Serra. Eles me convidaram para que eu fosse suplente. E eu então agradeci a
gentileza deles e pedi dois dias [para pensar]. Eu até brinquei: "Deixa eu
consultar minhas bases por dois dias". Na verdade, eu não ia aceitar. Eles
voltaram, eu agradeci, educadamente. Então o Quércia disse: "Pastor, eu
estou doente, você vai ser o senador". Eu disse: "É por isso que eu
não quero". Eu não tenho tempo para mexer com a política. Não quero. A
minha vocação é a igreja. Em São Paulo, nós temos 2.300 e poucas congregações
[filiais] ligadas ao nosso ministério. É um batalhão de gente.
No total, a Convenção tem quantas Congregações?
O número de evangélicos da Assembleia de Deus é um ponto de interrogação. Em
1994, eu já era presidente, eu fiz um censo entre nós e na época nós contamos
12,4 milhões de crentes na Assembleia de Deus. O crescimento da Assembleia de
Deus, é o levantamento que eu tenho, é de 5,14% ao ano. Quando estou falando de
membro estou falando daquele que foi batizado e tem responsabilidade na Igreja.
Quando o Fernando Collor era presidente eu falei: "Presidente, se nós
fôssemos políticos, a Assembleia de Deus teria muito mais condição de contar
com o povo do que o seu partido, porque vocês não têm uma filial em todos os
municípios do Brasil." A Assembleia de Deus temos em quase todas as vilas
de todos os municípios do Brasil nós temos um templo. São mais de 100 mil
templos que tem a Assembleia de Deus no Brasil.
A revista britânica "The Economist" recentemente comparou o
papa a um presidente de uma empresa. É isso mesmo?
A igreja tem os dois lados. Tem o lado espiritual e o lado material, o lado
social. No lado espiritual, é a bíblia, oração, jejum, ensinamento bíblico. Do
lado material, do lado do patrimônio, é uma empresa que nós temos que
administrá-la de acordo com as leis vigentes no país. A Assembleia de Deus
difere de outras igrejas evangélicas. Nós não vivemos correndo atrás do
dinheiro. O dinheiro para nós não é o essencial. Nosso desejo é ganhar almas
para Deus, o benefício da criatura humana. Nós somos um povo de vida social
modesta mas que procura cuidar da igreja administrando-a seguramente.
Qual a receita anual de todas as Assembleias juntas?
Não sei. Não estou lhe negando, porque esses valores [não são] da Convenção
Geral. E a Convenção Geral tem o caixa mais pobre do mundo. Estou há 25 anos e
desafio qual é o tesoureiro que possa dizer: "O José Wellington usou R$
0,05 do caixa".
E da Convenção?
São R$ 7 [milhões] ou R$ 8 milhões. É muito pouco. A nossa contribuição
mensal é R$ 5 por mês [por obreiro], vou aumentar isso aí. Cada igreja tem a
sua autonomia administrativa. Lá em São Paulo, essas 2 mil e poucas igrejas,
essas todo o dinheiro vem para o Belém [central da congregação de Wellington em
São Paulo]. E ali a gente administra e repassa para as construções e
compromissos da igreja.
A maior parte que vocês juntam é gasto com o trabalho social? Tem muita
gente que acha que as igrejas evangélicas servem para enriquecer os pastores.
Fui comerciante em São Paulo, e quando saí, não saí rico, mas com uma vida
econômica estável. E o que eu tinha eu conservei até agora. Eu tenho algumas
propriedades, eu já tinha uma boa casa onde morar, carro novo, caminhão. Não
joguei fora, conservei. Mas digo por experiência: se alguém pensa em ser pastor
para ganhar dinheiro, pode procurar outra profissão. Estou falando pastor, não
estou dizendo essa turma que vive explorando, arrancando dinheiro do povo. A
Assembleia de Deus não faz isso.
Quem faz isso?
[risos] Você é um moço inteligente. A televisão está cheia dessa gente.
Nosso afã não é esse. Estou construindo um templo-sede em São Paulo, porque
nossa igreja na verdade ficou muito pequena, então compramos uma quadra e
gastamos aí uns R$ 47 [milhões], R$ 48 milhões. Estamos no acabamento.
[Perguntam]: "Quando o senhor vai inaugurar?" Quando o dinheiro der
[risos].
Houve um aumento de quase 50% nos fieis da igreja entre 2000 e 2010,
segundo o Censo. Por que cresceu tanto?
Existem duas operações. Primeiro, a bênção de Deus sobre nós. E em segunda
lugar é que a salvação que recebemos de Jesus é tão boa, ela é tão gostosa, nos
trás tanta alegria, tanta satisfação, que todo crente tem o prazer de dizer que
é crente. Nós transmitimos para o nosso semelhante aquilo que Deus fez na nossa
vida. Então, nessa demonstração de fé, estamos ganhando outros para Jesus. Aí
está o crescimento da Assembleia de Deus. Não é nossa filosofia, não é nosso
preparo cultural, é esta vida saudável que recebemos de Deus e partilhamos com
aqueles que estão em volta de nós.
Com esse crescimento da igreja, e à luz do que ocorre com o Feliciano, o
senhor sente um aumento do preconceito contra os evangélicos no Brasil?
Não, ao contrário. A minha geração, quando eu era criança, eu me recordo
muito disso aí, quantas vezes os irmãos iam dirigir cultos ao ar livre, e
terminava debaixo de pedradas, jogavam pedras, jogavam batatas, ovos, cebolas,
era um negócio tremendo. Nós sofremos isso aí. Na época, nas cidades do
interior do Ceará, se somavam um chefe religioso, um delegado de polícia e um
juiz de direito e os três... Templos nossos foram destruídos, entravam nas
casas do crentes, arrancavam as bíblias, faziam fogueira de bíblias nas praças,
isso aí nós chegamos a conhecer no meu tempo. De lá para cá melhorou muito. Por
que? Ontem, nossa penetração social era classe D para baixo. Hoje, pela graça
de Deus, conseguimos alcançar uma classe social mais alta. A nossa igreja tem juiz
de direito, tenho 14 netos e todos eles formados, quatro médicos. Então essa
penetração social, ela mudou a visão da Assembleia de Deus. Esse problemazinho
do Marco Feliciano é muito mais de enfeite da mídia e um pouco de proveito
dele.
Às vezes, parece que ele está sozinho.
Nós temos por ele muita amizade e queremos o melhor para ele. Agora, não
fomos nós que o indicamos para presidente da Comissão. Agora, já que ele está
lá, vamos procurar dar um respaldo. Desde que também ele tenha um comportamento
que não venha a comprometer a igreja.
Fonte: Folha de São Paulo